Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva e especialista em comportamento político das classes C, D e E, afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o favorito para vencer as eleições presidenciais de 2026. A entrevista foi concedida ao Globo, como parte da série Jogo Político, e vai na contramão do pessimismo de parte da imprensa e do mercado. “Sem medo de errar, considero Lula favorito em 2026”, declarou Meirelles, ao defender que ainda há tempo para o presidente recuperar a popularidade perdida, especialmente entre mulheres e no Nordeste. “Essas pessoas querem gostar dele”, afirmou. Para o sociólogo, o peso da máquina pública e o enfraquecimento da direita organizada colocam Lula em posição vantajosa na corrida eleitoral.
Ao comentar a hipótese de uma possível anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro, Meirelles foi enfático: “Esse tema só vai servir para colar mais ainda a rejeição do Bolsonaro ao candidato da direita”. Ele avalia que a prisão do ex-mandatário pode até gerar comoção entre radicais, mas não terá força suficiente para mobilizar as massas. “Acho que só vai emocionar os jornais. Igual ao período em que o Lula foi preso.”
Sobre o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, considerado por aliados de Bolsonaro como possível alternativa ao Planalto, Meirelles demonstrou ceticismo: “Enquanto Tarcísio não pontuar de maneira relevante na pesquisa espontânea, ele não pode ser considerado viável. Deixa uma campanha eficiente colar o Bolsonaro nele para você ver o que vai acontecer...”.
Meirelles também apontou uma dificuldade do governo em converter avanços econômicos em ganhos políticos. “Embora a renda das pessoas esteja crescendo, boa parte do dinheiro da economia está indo para as BETs. São R$ 240 bilhões saindo da economia por ano.” Ele criticou a demora do Planalto em reagir à proliferação das casas de apostas, inclusive ilegais, e sugeriu novas abordagens para conquistar o eleitorado popular.
“A pessoa sabe se a vida melhorou se mudou a TV da sala ou se o filho comprou um tênis novo”, disse, ao apontar que índices macroeconômicos como IPCA, PIB e Caged já não bastam para medir o bem-estar social. Ele também alertou que o governo precisa apresentar um novo projeto de país, pois políticas como o Bolsa Família e o ProUni “já viraram política de Estado” e não encantam mais como antes.
Meirelles defendeu atenção aos trabalhadores informais e autônomos. Segundo ele, a esquerda comete um erro ao insistir em modelos antigos baseados na CLT, quando muitos preferem flexibilidade. “O PT deveria pensar em propostas como: obrigar empresas a criarem pontos de trabalho para esse trabalhador tomar banho e esquentar a sua marmita. Também poderia criar linhas de financiamento para a compra de bicicletas e motos.”
Sobre o papel do Estado, o presidente do Instituto Locomotiva foi direto ao contestar a narrativa liberal: “Entre bolsonaristas e lulistas, mais de 90% consideram que é responsabilidade do Estado garantir saúde gratuita. Mais de 60% acreditam que o governo deveria dar mais assistência e ajuda a famílias vulneráveis.”
Meirelles acredita que a oposição hoje ganha fôlego não por ser de direita, mas por adotar um discurso antissistema. Ele propôs que o governo federal se aproprie de soluções tecnológicas como forma de empoderar o cidadão.“Imagina se o governo federal cria um QR Code, coloca em unidades estaduais de saúde e as pessoas passam a poder avaliar o serviço de administrações estaduais e municipais? Lula deixaria de ser vidraça e passaria a ser pedra.”
Com olhar atento às transformações sociais, Meirelles encerrou afirmando que o Brasil não “dobrou à direita” como muitos defendem. Para ele, “o povo, do ponto de vista do Estado, está muito mais próximo do que pensa o PT do que a direita”, indicando que a disputa de 2026 ainda está aberta — mas com o favoritismo nas mãos de quem souber ouvir e representar a maioria.